Presencial 3 x 1 EaD

por Onevair Ferrari em 25.06.2018

Muito tem sido feito para transformar educação presencial em educação a distancia. A educação a distância ou EaD tem o grande mérito de levar oportunidade de aprendizado a alunos geograficamente distantes dos centros de ensino, de oferecer oportunidade de aprendizado a alunos que trabalham nos horários normais de funcionamento das escolas ou ainda permitir que o aluno acesse o curso de qualquer lugar, sem os transtornos da mobilidade nos grandes centros.

Mas o principal motor da EaD tem sido mesmo a redução de preço para os alunos e, principalmente, a redução de custos para as escolas.

Para os grandes grupos empresariais – nacionais e estrangeiros – que nos últimos anos compraram boa parte das escolas no Brasil da liquidação, alimentados pelo FIES e outros dispositivos de garantia de receitas, a transformação de cursos presenciais em cursos EaD, seja integral ou parcialmente, vem sendo um dos principais mecanismos de redução de custos.

E como fica o aproveitamento do aluno?

O aproveitamento do aluno é o principal resultado da educação e na educação a distância é influenciado por vários elementos interdependentes relacionados a seguir:

Ensino a Distância: é a parte da EaD sob controle direto da escola. Envolve recursos tecnológicos que constituem a plataforma de ensino, além de metodologias e conteúdos que possam ser replicados em grande volume, gerando receita continuada, com custo baixo a médio e longo prazo.

Aprendizado a Distância: é a parte da EaD que depende do aluno. Evolve equipamentos e infraestrutura de acesso (às expensas do aluno), motivação, dedicação, freqüência e interação com a plataforma da escola. É a parte mais soft da EaD, que inclui vontade, disposição e atitude do aluno, fora do controle da escola e que impacta mais fortemente nos resultados.

Custo para a Escola: os custos de um curso EaD são muito inferiores aos custos de um mesmo curso presencial, uma vez que os custos da plataforma de ensino e da metodologia são rateados entre os vários cursos EaD promovidos pela escola e os custos de conteúdo são diluídos nas várias realizações de um mesmo curso. Os custos de instalações físicas e de professores, a cada realização, praticamente não existem ou são muito reduzidos.

Preço para o Aluno: o preço de um curso EaD – aqui considerando somente os cursos pagos – costumam ser bem inferiores ao preço do mesmo curso presencial, ainda que geralmente não na mesma proporção da redução do custo para a escola.

Informações ou Competências: alguns temas são compatíveis com interações remotas, quando tratam basicamente de prover informações. Mas quando o tema exige aplicação, prática e experimentação, fica muito difícil desenvolver competência com EaD.

Conteúdo Limitado e Pasteurização: a EaD exige uma padronização que limita a extensão dos temas tratados. O conteúdo é função do repertório de conhecimento do autor do material e, por vezes, sofre enxugamento excessivo decorrente do formato remoto. A customização digital, quando existe, raramente permite tratar as características, necessidades e anseios de grupos de alunos.

Tempo de Tela e Robotização: num Brasil que já é recordista mundial em tempo de tela, com quase 5h/dia, segundo artigo recente do World Economic Forum, a EaD adiciona ainda mais tempo de tela, tornando esta interface enfadonha e criando uma sensação de robotização, por mais atraente que seja o conteúdo.

Motivação, Disciplina, Foco e Maturidade: a EaD testa a motivação do aluno com muito maior freqüência, já que a iniciativa cabe sempre ao próprio aluno. As altas taxas de evasão são indicadores cruéis desta fragilidade. A atenção do aluno tende a ser mais curta no meio digital e o próprio dispositivo, seja ele computador, tablet ou celular, oferece inúmeras possibilidades de distração, exigindo muita disciplina e maturidade do aluno para manter o foco no conteúdo do curso.

Convivência com Professores e Colegas: a educação a distância, por mais que utilize recursos de fóruns, chats e peer reviews, ou promova encontros periódicos, não consegue oferecer a convivência dos alunos com seus pares e com os professores. O networking durante um curso presencial, por sua vez, pode abrir muitas janelas de oportunidade, durante e depois do curso.

Atualização e Contexto: parece antagônico que um curso EaD perca rapidamente a atualização, mas isso ocorre porque é preparado com meses de antecedência e, por vezes, faz referência a eventos do passado, com menor impacto. Nos cursos presenciais, sempre há espaço para os acontecimentos recentes, que podem ilustrar os temas e permitir analogias de aplicação no contexto do mundo real, o que facilita a percepção de utilidade do conhecimento.

Avaliação e Reconhecimento: os cursos EaD geralmente utilizam sistemas de avaliação mais brandos do que os cursos presenciais. Costumam ser até ser mais trabalhosos do que nos presenciais, mas com menor grau de dificuldade e isto acontece devido ao formato de interação. Como conseqüência direta, o reconhecimento de uma formação por EaD ainda é bem menor que o de uma formação presencial.

Aproveitamento do Aluno: este é certamente o ponto mais crítico da EaD, pois o resultado final depende muito da capacidade de organização, da disciplina e da motivação do aluno. Neste aspecto, componentes culturais como falta de comprometimento, indisciplina e pré-disposição para burlar as regras de conduta do curso podem resultar numa inconsistência ainda maior do resultado.

Você se submeteria a uma cirurgia com um médico formado em Medicina num curso EaD? E se você tivesse um projeto importante, contrataria um gerente de projeto com formação EaD? A exemplo da cirurgia, no campo da Gestão de Projetos o conhecimento teórico representa uma parte essencial, mas totalmente inócua sem a parte prática da aplicação.

Minha experiência ministrando o mesmo conteúdo em cursos presenciais e em cursos EaD de Gestão de Projetos, para públicos de perfis semelhantes, submetidos a sistemas de avaliação semelhantes, aponta para uma relação de 3 x 1 com o triplo de aproveitamento dos alunos nos cursos presenciais.

Então, para alguns campos de conhecimento, de caráter informativo, EaD pode ser uma boa opção. Porém, para outros campos de conhecimento, de caráter formativo, de construção de competência, EaD pode até ser um começo, mas nunca será o suficiente.

Onevair Ferrari, DSc, MSc, PMP é professor, consultor, palestrante, coach em Gerenciamento de Projetos e diretor da Nexor.
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